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Sobre estas ruínas de edifícios modernos (a artista escolheu uma fábrica abandonada), a presença de uma natureza exuberante dá à imagem um primeiro gesto impossível, de una primeira ficção. Este fato poderia ser assimilável. Não o é, entretanto, a presença dos habitantes. Uns seres humanóides, vestidos com túnicas, pertencentes a um outro tempo e a um outro espaço. Alguns com penteados estranhos, outros completamente carecas. Têm em comum um certo medo; refletem em seus rostos o anúncio do perigo, o suspense de uma tragédia; mas, ao mesmo tempo, uma tranqüilidade inquietante, uma calma aterrorizante.
O embrião da série “Adaptação Margem” se constitui de um conjunto de desenhos e palavras que começaram a tomar forma graças a um sexto sentido. Talvez Florência veja seres que realmente existem e só ela vê (lembrem-se da imagem mil vezes parodiada da criança escondida na cama – “há momentos em que vejo mortos”). A partir dos esboços e das vozes da artista, já em sua faceta sobre-humana, ela começou a “materializar, sem saber em que iria transformar: objetos, tartarugas, montanhas de cabelo humano, ferramentas, roupas, pedaços de madeira. Organizei o universo da comunidade e esperei”.
Fruto dessa espera são os seres (que ela chama de “comunidade”) com duas cabeças, penteados impossíveis, envoltos de uma atmosfera tão sólida que parece uma presença a mais.
Compreender esses estranhos habitantes de semblantes assustados, parecidos com humanos, acompanhados de cachorros, parece-nos complicado. A ficção sugere a fábula na mente do voyeur, que é parte determinante para finalizar a obra desta artista. Imaginamos a história dessa espécie de seita pagã, fugindo de algo ou de alguém, refugiando-se em casas abandonadas, escondendo-se também da luz, um brilho que cega, que cobre tudo lá fora e que ameaça ao fazer explodir a aparente paz interior.
Florência Rodriguez consegue renovar esse surrealismo narrativo. Desde o início da memória pré-histórica, o homem tem recorrido ao mito para entender o incompreensível. Desde os grafismos nas cavernas até as primeiras fábulas milenárias, passando pelas parábolas bíblicas e as anedotas protagonizadas pelos heróis da antiguidade. Ela cita várias referências; “os gregos, a ficção científica, as histórias místicas, minhas invenções”.
A invenção como arcobotante (construção exterior, nos edifícios góticos, que termina em arco de círculo e serve de apoio a uma parede ou abóbada) da vida real vem sendo utilizada na arte com fins bem distintos, geralmente ligando-se ao ato religioso, à chamada da fé. É com o surrealismo, no começo do século, que o criador dá asas à sua psique, ao seu inconsciente, e materializa seus sonhos em uma tela. Sem moralismos, os contos “irreais” tornaram-se alimento para a mente cinza do receptor, do expectador. A sugestão que emana da razão (ou de sua ausência) também tem sido explorada desde os primórdios do cinema, com vários filmes que, enquanto relatos da antigüidade, bem podiam anteceder às cenas de Florência.
Seja qual for o relato preciso da artista, assim como seu objetivo, o certo é que somos levados a observar perplexo suas magníficas fotografias e a estranha beleza que retratam. É impossível voltar a entrar em uma casa vazia sem ser atacado, ainda que inconscientemente, por algum dos fotogramas indeléveis dessa fabuladora do invisível.
Autor: Juan José Santos.
O que chamamos hoje de vídeoarte deve ser entendido como linguagem das artes visuais desassociada do cinema, ainda que não se furte, necessariamente, a manter com este produtivas relações. Muito embora seja remanescente deste, considerando as experimentações dadaístas e surrealistas de Man Ray e Salvador Dali, por exemplo, durante os anos vinte do século passado, a vídeoarte só vai ser instaurada de fato quando Nam June Paik, no final da década de cinqüenta, vai firmá-la como tal, ao eleger a câmara como instrumento importante de expressão.
Artista e professor de Artes Visuais do CEFET/CE
A arte geométrica de János Szász Saxon oferece bons exemplos ao mesmo tempo aos teóricos e ao público por manifestar simultaneamente a analogia de que a ferramenta empregada, a ciência e a arte são diferentes. Quando refletimos a partir desta afirmação, concluímos que em muitos pontos respectivos ambas estão lado a lado. Uma outra verdade fundamental sobre a qual podemos ter atenção é que cada artista geométrico tem uma teoria que o espectador não é entretanto, obrigado a aceitar, ou seja, aquelas não são teorias que o artista transmite com instrumentos geométricos. Além disso, mesmo que seja possível reunir uma linguagem geométrica mais geral, que os artistas geométricos consideram entre eles mesmos uma espécie de denominador comum, devemos aprofundar separadamente a teoria de cada artista e “devemos aprender” cada uma das obras, a despeito do fato que as obras sejam apreciadas sem nenhuma ciência prévia.
Saxon-Szász pôs em questão uma teoria coerente, a teoria dos “universos polidimensionais”. É uma explicação do mundo global, no qual aquele artista confere uma função ao ponto, à linha, a diversas figuras planas e espaciais, e que não entra em contradição com a visão de mundo científico de outra época, tudo estando pleno de formulações pessoais e tentativas de expressões muito subjetivas. O artista tenta exprimir a experiência fundadora sobre a qual domina uma ordem impressionante na estrutura do universo. O sistema se estende por estruturas infinitamente pequenas (nano) a estruturas infinitamente grandes (giga). É ali que estão reunidas reflexões atuais sobre os fractais e a teoria do caos. Todos nós fazemos parte de um modo privilegiado do mesmo processo infinito, e certas obras constituem as formas de concretização deste processo. O pressentimento do sistema do universo é ao mesmo tempo a afirmação da concepção de sua gênese, motor da criação artística. A palavra-chave aqui é “criação”, em um senso tecnológico e entre os não-figurativos e construtivistas do século XX, em um senso estético. Ao contrário de outros artistas geométricos, que por temor de se entregarem a uma imitação teológica e a uma cópia servil escolheram o método da construção a partir de elementos geométricos de base, para expressar uma senso de mundo que Saxon-Szász procurou uma linguagem e conseguiu encontrar a geometria.
As características particulares da arte podem ser deduzidas da compreensão da “passagem dimensional”. Sua invenção, o “lápis dimensional” é uma metáfora muito figurativa, por meio da qual – como diria Klee – podemos penetrar em uma linha movimentando o ponto, e a partir deste o plano. Mas podemos também mudar de escala e ir de encontro a algumas ramificações menores e mais finas ou na direção oposta, e até mesmo em direção às galáxias. Se considerarmos a série de mudanças de escala como um processo, isso pode funcionar muito bem em seu inverso. Neste caso as linhas podem ser apreciadas concentradas no plano, o ponto adquire uma densidade máxima. Um dos casos típicos de modificação de dimensão nas obras concretas é quando em uma aresta de um quadrado muito grande surge um agrupamento de pequenos quadrados prolongados (jogo de escala dimensional), e que em outro momento ao longo dos lados do quadrado nascem pequenos quadrados e ao seu lado outros ainda menores (quadrado preto polidimensional). Como se as linhas laterais se tornassem pouco a pouco cinzeladas – ainda uma analogia com os fractais. Mas se o artista quer expressar que certos campos de imagem (de forma retangular) tornam-se pouco a pouco estreitos, e logo são confundidos com linhas pelo olho humano, podemos imaginar que após três ou quatro patamares, a faixa fina e de comprimento improvável irá emergir do campo (concentração dimensional, antenas dimensionais). Este procedimento manifestadamente vai de encontro com a forma e a composição, ao passo que o ato de cinzelar traz consigo perspectivas de novas ornamentações. Com a degradação em volta da parte de baixo da escala, podemos também chegar a multiplicação de uma divisão que se apresenta como um lado branco, surge passando por um tecido branco um sistema de campo colorido onde o branco está como último plano e a figura colorida se equilibrando (Passagem imaterial)
É preciso ressaltar que as perspectivas ornamentais dependem dos valores decorativos de cada obra, que provêm campos de cores homogêneas e de contornos do tipo shaped canvas. Podemos concluir de tudo isso que cada sistema quadrático pode facilmente, e isso conduz a um resultado formal extraordinário, ser transposto em um sistema triangular ou circular.
A existência das antenas dimensionais (e outros objetos pictóricos com título análogo) sugere que a obra de Saxon-Szász pode ser simplesmente aproximada do campo lingüístico. Do alto da imagem em direção ao seu interior parte uma “fenda” se modelando de forma delgada gradativamente ou então vemos jorrar uma “antena” - uma “mancha”, um tentáculo ou eventualmente um cabo. Em outros painéis, Toques dimesionais, Portas dimensionais estão todos enquadrados no caso “dos degraus”.
A confrontação entre a herança de Malevitch e do MADI está colocado em evidência, em 2006, durante um festival organizado por Dardai e Saxon, casal de artistas, Saxon introduziu um elemento fundamental do suprematismo de Malevitch, “o quadrado negro”, um outro elemento do suprematismo, “a cruz branca” .
Anteriormente a “cruz branca” desmontava/ decompunha o “quadrado preto”. Saxon já confrontara essas duas formas: o quadrado preto e a cruz branca, porém no caso presente a transcendência das criações geométricas não se exprime em termos do “Espiritualismo Russo”, mas resultam de uma intuição criativa. Se até agora podíamos aproximar a obra de Saxon com qualquer conceito, como fractais, mudanças de dimensões...agora o artista se interessa bastante pela repartição de plano-superfície segundo o modelo dos critérios geométricos e afim de reestruturar “polidimensionalmente”, a cruz de Malevitch. Os rigorosos monocromos come as obras utilizando contrastes entre preto e branco adquirem um impacto psicológico graças as variações de estruturas, respondendo a uma lógica visual
László Beke